quarta-feira, 18 de julho de 2012

Meu mundo

"Conforto alucinante, tranquilidade na clareira do caos
O ponteiro, ele rodou mais rápido no mesmo relógio de ontem
O que as horas guardam nos espaços do contra-tempo?
A mulher?

*
O desejo é um tempo parado
É quando se trocam as datas dos bichos e das flores
É quando aumenta a rachadura da velha parede
É quando se vira a folha, a folha da história
É quando se pinta um fio branco na cabeleira preta
É quando se endurece o rastro de sorriso
No canto dos olhos
Eu sei que a viagem é longa
A voz vai e vem
Você ta aí?
Você ta aí?
Ei, voce est aí?
Vontade de abraçar o infinito"





[Otto, Lirinha - Meu mundo]

domingo, 8 de julho de 2012

drão.

'quem poderá fazer
aquele amor morrer
nossa caminhadura
dura caminhada
pela noite escura...'

Isto não é uma ode à morte. São palavras dedicadas à vida. A vida que você me deu.

Não lembro o dia, mas era de tardezinha e não fazia sol. Você já estava no carro conosco, deitada em sua caminha (que só foi usada naquele dia) e com sua roupinha que te acompanhou até o dia de ontem. Eu tinha onze, você um.  Você não gostava da maioria dos brinquedos que comprávamos. Gostava dos meus bichinhos de pelúcia que tentavam sem sucesso imitar a sua pele. E você os enchia de carinho com sua língua e depois nós ficávamos assustados porque achávamos que tinha engolido algo perigoso. 
Perigo é não ter você por perto. 
Tu me vistes chorar como poucos. Me lembro do dia em que subiu na minha cama e começou a lamber as lágrimas. Eu pensava como poderia existir no mundo alguém pra secar as lágrimas de outra pessoa. Você zelou meu sono mais profundo, embora no meio da noite minhas pernas tentassem te expulsar da cama. E no dia seguinte lá estava você de novo. E de  novo, de novo...mas não hoje. 
No começo eu tinha medo e escondia meus pés em cima da cadeira - pra que você nem ousasse me cheirar.  Uns meses passados você já corria de medo do meu abraço que esmagava. 
Você me ajudou nas provas,
nas cólicas,
nas dores,
na solidão.
E me ensinou a amar de uma maneira que nenhum outro ser vivo conseguiu. 

Então era isso. Era desse modo que acontecia. A vida encerrava-se sem tempo extra. Sem despedidas e sem calor. Seus olhos já não eram mais os mesmos e eu compreendia isto. Compreendia que você precisava deixar esse vazio aqui dentro - que ninguém nunca mais irá preencher. 
Os olhos de jabuticaba. 
As roupinhas que você nunca usou.
Os incontáveis panos que você espalhava pela casa.
A tua respiração. O teu ronco. O teu choro. 
A sua barriga encostada na minha. 
A tua alegria. E a minha. E a nossa.

Tudo isso que você deixou e será sempre seu. 
Bem aqui dentro. 

Eu não sei onde você está, nem o que fizeram com você. E acho que nem quero. Abençoados aqueles que cruzaram o teu caminho por um mínimo momento.

Gostaria apenas da certeza que todo mundo, ao menos uma vez na vida, há de sentir um amor tão imenso e genuíno como este.


Para sempre minha. 


'Se o amor é como um grão
Morre, nasce trigo
Vive, morre pão'