terça-feira, 27 de novembro de 2012

outro dia do lado de lá





Outro dia do lado de lá

Dezessete, nove, pois... Dezenove, três, pois...
Tá escutando? Tá escutando?
Ando bêbado de lucidez, impregnado de realidade.
“Mantenha o controle!”- diziam-me.
Um cigarro, um trago, um pega, um tiro, um pico.
Um pico de felicidade, mais uma dose, por favor.
Não era esse o problema.
O problema estava em volta e não dentro de mim,
mas eles não ouviam, não observavam.
Certamente era mais fácil fechar os olhos.
Eu também gostaria de ter fechado os meus,
mas a madrugada no quarto falava mais alto,
e, junto dela, as paredes e as camas chamavam-me.
“Vai ser melhor pra você!”
Do lado de dentro éramos zoológicos, zumbis e zuretas.
Neste depósito de carne humana,
depositei todo meu resto de lucidez.
Enquanto os homens de branco
faziam daquele espaço entre muros
seu teatro particular.
Éramos seus fantoches preferidos.
“Mais um pouco de sossega leão, senhor?”
Tá escutando? Tá escutando?
Você tá me escutando?
O pátio ainda estava sujo
infestado de tristeza mundana,
tristeza humana e dejetos.
Os gritos à noite eram mais intensos.
Pior eram os gritos da cabeça,
da minha própria cabeça
encharcada de desejos secretos.
Era o diabo, estava eu no inferno,
no teatro dos vampiros
e os sanguessugas não éramos nós.
Invadiram-me com ondas na cabeça,
no cérebro fui sentenciado.
Em uma dessas descargas de energia
lembrei-me de minha criança,
do seus olhos que vagavam
e hoje não sei por onde vagam mais.  
Aqui os dias passam.
Até quando passarão, não sei.
Acho que não me importa.
sucumbi a tudo que ouvi,
Sucumbi às pílulas, ao prontuário
e aos homens de branco.
À infinidade de verdades
que me fizeram acreditar.
Já não me importa mais.
Tá escutando? Tá escutando?
Você tá me escutando?
Você deseja me escutar?
Dedicado àquele que joga a pedra e esconde à mão.
J. Gottschalk









Para a disciplina "O campo da atenção psicossocial"

.

Tem dias que a saudade se adianta
dos dias que não chegaram...

segunda-feira, 19 de novembro de 2012

ei, lobo da estepe...


''lobo da estepe, acredito na tua dor.''

Era um dos olhares mais fortes que os olhos já alcançaram.Ninguém entendia muito bem o que se passava em meio a tanta conversa, lenha, músicas e fogueira. Mas era algo forte, definitivamente. Sentíamos medo do próximo instante, do porvir. A prisão, as pedras preciosas, a morte, o crime, a penitência, a culpa e a vida a qual agora era obrigado a submeter-se. Não! Ele era forte demais para submeter-se a algo. E se estava lá, era porque havia apostado grande parte das fichas nesse jogo. Mas não todas. Não! Não era imprudente.
Era como o Lobo-Harry. Forte demais para lutar, fraco o suficiente para cair.
Todos ao redor o lembravam constantemente de sua essência selvagem de lobo, ao mesmo tempo em que ele deveria lutar por uma terra dos homens. Homem que ele não era, diziam, lembravam-o. A vida não era menos difícil só porque sabia sobre mineração e pesca como ninguém sabia. Sabia também sobre a morte, isso sabia muito bem. Ninguém consegue esquecer a face da morte quando encontra-se tão perto dela. Ele ainda não esquecia, podia ver no reflexo de sua íris seu ódio e sua saudade melancólica.
Se arrependimento matasse(...)não saberia dizer o que faria, pois arrependimento não era um sentimento possível para os homens de pele vermelha. Arrependimento é coisa de homem branco e fraco - não era para ele. Nem para lobos das estepes.
Gostaria de lembrar as palavras que atravessaram meu corpo e espírito. Das palavras que borbulharam durante uma noite de pouca lua. Poucas lembranças concretas, às vezes até parece sonho. Sei que não é. Ainda posso sentir o calafrio daquela noite e a pedra esverdeada - seria um quartzo verde?- me acompanha. Ainda não virou um colar, como havia prometido, mas um dia virará. E eu voltarei só para mostrar-te como fui grata por esse encontro.






''esse lobo nunca mais vai uivar...''

domingo, 18 de novembro de 2012

fuga

Tinha tanto medo de ser feliz 
que, ao ver a mínima chance
correu para outro copo de café. 

quem haveria de resgatá-la outra vez? 

domingo, 11 de novembro de 2012

só.

Hoje não precisava escrever sobre sentimentos mortos
coisas enterradas
ou trechos de seu alemão ou argentino preferido.

hoje deveria parar de ferver, borbulhar
pensar, pulsar.
hoje, a noite seria distinta
poderia encostar o cabelo
e olhar o teto de tsurus
sem medo do amanhã amanhecendo.

a Segunda poderia esperar
pra bagunçar um pouco mais
todo resto da semana.

quinta-feira, 8 de novembro de 2012

e assim foi.

[...] e quanto mais remexia, remoia, fundia
e esvazia
percebia todo o caos que se confundia
dentro dum mesmo.
era puro sangue, 
água e vinho
fermentos e nicotina
fumaça sumia. 

abre a cortina, querida. 
minha vida quer gritar.