era esse o gosto da morte. não sentia na pele, mas sentia na boca, no estômago, nas entranhas. nas entranhas dele que estavam pela rua e agora estão dentro dela. nas entranhas das pessoas que passavam, olhavam e nada faziam. nas entranhas dos carros que o golpeavam outra vez. nas minhas veias. a morte tinha aquele gosto acre para quem vê. aquele gosto que ocupava todo espaço do seu corpo e nada mais pode ser ingerido.a morte trazia aquela sensação de culpa e alívio inconsciente, ''pelo menos não sou eu'' - mas poderia ter sido. a morte poderia ser aquela vontade que dá às cinco da tarde de comer pão com manteiga, mas está chovendo muito para sair à padaria. não era assim tão simples. agora não havia mais espaço para explicações. era mais um sob a terra ou em qualquer outro lugar que o tenham levado. os carinhos que recebeu, as moléstias que aguentou, as brincadeiras que fez e todo o caminho que percorreu...morreram junto com ele e com o carro que um pedaço seu levou.
a alguns lhes restam a terra, quem sabe o mar? um rio...alguns trocam dinheiro por um mármore - mais limpo que muitas casas - para morrer, mas não a ele...a ele restava um saco plástico de lixo. e a ela...aquele terrível gosto acre que sempre tem a morte alheia.
Escrevendo cada vez melhor. Mas eis a pergunta, o que tem concatenado esse amargo gosto?
ResponderExcluirgracias, querido anônimo! esse gosto veio, de repente, quando cruzei a rua e me deparei com uma vida que se acabou...
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